segunda-feira, 29 de outubro de 2012



CHEGAS...


"Chegas, e de repente eu me pergunto como pude ser poeta antes de ti,
antes de nossas horas encandeadas ...
Como pude escrever coisas que agora me parecem belezas mutiladas ...
Chegas, e de repente me surpreendo de que ainda haja surpresas para o amor,
marcado como estou de cicatrizes ...
Eu que escrevera um dia amargurado: "agora em meu caminho só reprises" ...
Chegas e eu adolesço de alma e corpo e de repente, num verão que abrasa
como nunca pensara nem supus, sou todo novos ramos, verdes ramos,
sou todo sol numa eclosão de luz ...
E nessa ânsia de amor que me sufoca que te sufoca como uma onda, e cresce,
e invade tudo, e é o tema de meu canto, só um desespero surdo me consome:
é perceber quanto perdemos, quanto ...
E me deixar a imaginar a vida que não viveste, mas que te manchou
com a lembrança de inúteis pensamentos, esta vida afinal que eu nem sabia
e agora solto como um lastro aos ventos ...
Jogo aos ventos, enquanto ascendo e vejo em teus olhos um mundo de ninguém
e uma paisagem que ainda está sozinha ...
Oh! meu amor, tudo é começo e é novo agora que sou teu e te sei minha ...
Um mundo que eu nunca suspeitara ...
E eu que falava em mundo antes de ti, como se antes de ti pudesse ser ...
E eu que falava em vida antes de amar-te, e eu que falei de amor, sem nada ter ...
Chegas. E de repente me pergunto que amor é esse que viveu sem ti?
Que flores? Se não houve primavera ...
Ah! nascemos agora, um para o outro, e antes não fomos mais que vã espera ...
Antes, não fomos mais que espera vã...E agora que existimos nesse amor, penso que se afinal não te encontrasse,
o amor teria sido uma palavra, uma palavra inconseqüente e fútil, nada mais,
nada mais que uma palavra; e outra palavra a vida,
e só palavras todo o meu canto ... e esse caminho inútil ... "

(J.G. de Araujo Jorge)      

Nenhum comentário:

Postar um comentário